Imagine um modesto clube brasileiro cruzar o Atlântico, encarar o grandioso Real Madrid, no Estádio Santiago Bernabéu, e voltar da Espanha com uma vitória. Parece roteiro de filme, dos mais inacreditáveis, né? Pois aconteceu!
Há 48 anos, a Portuguesa-RJ, time da Ilha do Governador e que só servia para compor tabela no Campeonato Carioca, fez a rota acima e mandou 2 x 1 no apelidado clube merengue.
Mesmo sendo “time pequeno” como o torcedor carioca apelidava os últimos colocados do seu campeonato, a Portuguesa-RJ arrumou um empresário que conseguiu vender amistosos por gramados europeus. Desembarcou na espanhola Sevilha, para encarar um adversário com o mesmo nome da cidade, do qual seus jogadores não tinham nenhuma informação, pois, na época, notícias do outro lado do mundo demoravam a chegar ao Brasil. E nem todos tinham televisão, ou liam jornais.
No hotel onde se hospedavam, os rapazes tentavam adivinhar o poderio do adversário. Pelo aspecto da cidade, imaginavam que seria uma equipe tipo a do América-RJ, de nível médio, mas nunca um Botafogo (bicampeão da Taça Guanabara-1967/1968), ou um Fluminense, que despontava como o provável ganhador do título carioca de 1969.
Enquanto viviam a expectativa da estreia, os jogadores da Portuguesa foram tomados por uma grande decepção: a partida contra o Sevilha não rolaria mais. E nem lhes explicaram o motivo. Que pena! Eles estavam tão animados! Queriam matar o empresário, e só não o fizeram quando receberam a notícia completa do que estava acontecendo, o que vamos ler no parágrafo abaixo.
Pois bem! O glorioso Real Madrid andava à procura de um adversário, de preferência fraco, para promover a sua festa de entrega das faixas de tricampeão espanhol das temporadas-1966/1967; 1967/1968; e 1968/1969. Ao saber que a Lusa da Ilha do Governador andava pela Espanha, enviou um diretor para atravessar o jogo com o Sevilha e leva-lo para o Santiago Bernabeu. Rolou uma grana na mão do empresário, que se virou com os sevilhanos para cancelar a partida. O tal rolou US$ 50 dólares no bolso de cada jogador da Lusa, que deveria ganhar cinco vezes menos do que aquilo por partidas que fizesse a Europa, e levou o jogo par Madrid.
Era 4 de setembro de 1969 e o time espanhol escalou todos os seus titulares. O treinador Miguel Muñoz Mozún exigia a vitória, para ficar o maior tempo possível invejando os rivais, mostrando-se imbatível. Só faltaram combinar com a Lusa da Ilha e como ponteiro-direito Miguel, que marcou os dois gols da vitória do time carioca, que só tinha de forte a união e a vontade de superar em todas as partidas, mas quase sempre goleado por Botafogo, Vasco da Gama, Flamengo e Fluminense.
A vitória da Portuguesa sobre o Real começou a ser construída no primeiro tempo. Aos sete minutos, o atacante Miguel abriu o placar para a Lusa. No fim da etapa inicial, aos 42 minutos, o mesmo Miguel marcou o seu segundo gol e ampliou o placar para a equipe da Ilha do Governador, que saiu de campo para o intervalo vencendo por 2 x 0.
No segundo tempo, o Real Madrid partiu para cima, em busca do empate, mas só diminuiu o marcador aos 45 minutos, por Planelles. Mas já era tarde demais para igualar o confronto visto por mais de 50 mil pessoas.
O ponta-esquerda Escurinho (foto), que marcou época pelo Fluminense das décadas-1950/60, foi um dos principais destaques do dia. Ao final da partida, quando já estava no chuveiro, ele recebeu sondagens de dirigentes da equipe merengue, mas nada rolou por conta do seu caráter. Disse que estava com 39 nos costados, que aquele era o seu último clube e que ele já era um "ex-jogador em atividade".
A Portuguesa-RJ do gasde feito foi: Bruno; Chiquinho, Jerry, Beto e Zeca; Carlos Pedro e Nei; Jorginho, Miguel, Jurandir (Paulo Mata) e Escurinho. Real Madrid: Junquera; Espildora, Bibiloni, Benito e Jose Luiz; Tejada e Miguel Perez; Fleitas, Planelles, Grande e Bueno.
Aquela não foras a única aprontação da Portuguesa-RJ na Europa. Em 10 de junho de 1956, na Polônia, mandara 4 x 2 Wisla Kraków e, oito dias depois, empatara, por 1 x 1, com o Dínamo Moscou, tornando-se o primeiro time brasileiro a jogar na então União Soviética (atual Rússia). Antes dela, apenas cinco times brazucas haviam jogado no Estádio Santiago Bernabéu: 08.11.1953 - Real Madrid 0 x 0 Cruzeiro-RS; 15.05.1955 - Real Madrid 2 x 2 Botafogo; 31.05.1956 - Real Madrid 4 x 2 Vasco; 18.05.1957 - Real Madrid 5 x 3 Sport Recife e 17.06.1959 - Real Madrid 5 x 3 Santos..
OBS: até 1955, o Santiago Bernabéu chamava-se Estádio Chamartín.
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