Em 1952, o Brasil era presidido por Getúlio Vargas (1951-1954). Foi por ali que Luís Alonso Perez, o Lula, tornou-se treinador dos times amador e infantil do Santos Futebol Clube. E fez melhor do que o Vargas, que não tirava o país de permanente crises política, econômica e social, enquanto ele, de cara, conquistava títulos nas duas categorias.
Por aquele tempo em que comandava a moçada da base, Lula aprendia macetes com o treinador do time principal, Aymoré Moreira. Anotou tudo e, em 1953, o substituiu. Em 1955, uma temporadas após Getúlio Vargas sair desta vida e entrar para a história, Lula ajudou o Santos a encerrar 20 temporadas de choros, recuperando o título de campeão paulista. E partiu pra conquistar tudo o que se disputava pela época, além do já citado Campeonato Paulista. Colecionou faixas do Torneio Rio-São Paulo; das Taças Brasil (formato da Copa do Brasil de hoje) e Libertadores das Américas e do Mundial Interclubes. Mesmo sendo o máximo, em 38 disputas – oito estaduais paulistas; quatro RJ-SP; cinco nacionais (Taça Brasil); duas sul-americanas (Libertadores) e duas intercontinentais -, ele nunca foi lembrado pela Seleção Brasileira, um dos seus sonhos.
Lula com Athiê Cury, reproduzidos da revista O Cruzeiro
Nascido, em Santos-SP, no primeiro de março de 1922, Lula viveu até 15 de junho de 1972. Antes das glórias no futebol santista, ele ganhava a vida trabalhando em uma leiteria. Na bola, jogava as suas peladas quando aventurou-se ser treinador de dois times amadores. Depois, chegou ao Departamento Amador da Portuguesa Santista, de onde o tirou o vice-presidente do Santos, Aristóteles Ferreira. Quando Aymoré Moreira foi chamado para dirigir a Seleção Paulista, ele o substituiu, em duas vitórias sobre o São Paulo -, sendo efetivado no comando do time do Peixe, no 5 de junho de 1954, em Santos 3 x 2 Botafogo, pelo Torneio Rio-São Paulo, no Maracanã. A partir dali, foram 949 jogos sob a sua direção, com 771 vitórias, além do lançamento de vários craques, entre eles Pelé, Coutinho e Clodoaldo.
O último Santos de Lula foi em 19 de dezembro de 1966, nos 3 x 0 Prudentina, pelo Paulistão. Falou-se que ele deixou a Vila Belmiro por desentendimentos com o Pelé, mas isso nunca se confirmou. Mas pode ter fundo de verdade, pois não era o ‘Rei do Futebol” o seu atleta predileto, mas Lima, um coringa que jogava onde ele precisasse, destruindo, armando e atacando “ com a mesma eficiência”. No entanto, para o seu fim de linha na Vila Belmiro, oficialmente, valeu mais a fraca campanha do seu time que perdera o Estadual-SP, para o Palmeiras, e a Taça Brasil, levada pelo Cruzeiro-MG, esta dentro do paulistano Pacaembu, com virada de placar. Pior do que isso, dizia, só ter perdido o Paulistão-1959, para o Palmeiras, em melhor de três.
Passado um tempinho distante das grandes glórias santistas, Lula estava do outro lado do balcão, em 1968, ajudando o Corinthians a vencer o Santos (2 x 0) e encerar jejum de 11 temporadas inglórias no Paulistão. Fez 35 jogo, com 20 vitórias, sete empates e oito derrotas corintianas, e dirigiu, também, os times da Portuguesa de Desportos e do Santo André, sonhado em voltar para a Vila Belmiro. Embora Dorval, Mengálvio Coutinho, Pelé e Pepe tenha ficado na história por ataque mais famoso do Santos, para ele, esta glória a transferia para Dorval, Jair Rosa Pinto, Pagão, Pelé e Pepe.
Dos oito títulos de campeão paulista conquistado por Lula, ele considerava o de 1964 o mais difícil, porque o seu time não andava bem, fisicamente e andou sendo desfalcado pelos defensores, Mauro Dalmo e Calvet. Mas ele deu um jeito, mostrando-se grande treinador. Por sinal, ele dizia que para ser bom nisso, era necessário “ser honesto, fazer com que comandados tenham confiança em si, ter autoridade no serviço que executa, evitar palpites de terceiros, e saber dirigir-se aos seus jogadores nos diversos momentos”.
REPRODUÇÃO DE GAZETA ESPORTIVA
Primeiros tempos de Lula trinando o Santos, ainda sem Pelé
Mesmo se desgastando, fisicamente, em treinos e jogo, Lula pesava 115 quilos quando dirigia o time santista. Era enérgico, quando necessário, mas não gritava com os seus jogadores, tinha paciência, preferindo agir como conselheiro, irmão mais velho. Casado – com Ivete – teve três filhos: Luís Alonso Perez Júnior, Marcos Tadeu e Leonor Maria.
Após tornar-se bicampeão mundial interclubes, o Santos caiu, assustadoramente, de produção e perdeu o título do campeonato Paulista-1963, para o Palmeiras. A explicação de Lula era a de que os jogos contra o italiano Milan, pelo caneco intercontinental, deixara a maioria dos seus titulares contundidos, longe de encarar disputa tão dura como o Estadual-SP. “Durante o returno, estivemos, praticamente, sem equipe. Perdemos Gilmar (goleiro), Calvet (lateral-esquerdo), Zito (volante), Dorval (ponta-direita) e o Pelé, entre outros, em muitos jogos seguidos, uns por contusões e outros por estafa. Por isso, perdemos jogos que o torcedor não imaginava acontecer”, justificava-se à imprensa, sempre que tocado sobre o tema, lembrando ter usado, muito. time misto de reservas e titulares no segundo turno do Paulistão.
Lula usava, também, uma outra tangente para explicar pisadas na bola: o envelhecimento de sua rapaziada, e citava os casos de Gilmar, Mauro (zagueiro central), Zito e Pepe que, segundo ele, não demorariam a chegar ao ponto final da linha. O aviso sobre queda de produção apresentou a conta, mas Lula jurava que o fato não o derrubaria. Realmente, ele se segurou no cargo por mais três temporadas, levando a galera aos títulos da Taça Brasil-1964/1965; do Estadual-SP-1964/1965 e do Torneio Rio-São Paulo-1964/1966, este dividido com Corinthians, Botafogo e Vasco da Gama.
Em 1964, a imprensa via o Santos mudando a sua forma de jogar e a apelidou por “sanfona”. Lula, no entanto, discordava e garantiu à Revista do Esporte que a sua rapaziada atuava como sempre o fazia: “Não inventei nenhum sistema, pois futebol não muda e nem o chamei por ‘sanfona’. Foi a imprensa que botou nome na maneira em que o Santos jogou algumas vezes. Muita gente.....inventa as coisas mais variadas”.
FOTO REPRODUZIDA DE REVISTA DO SANTOS
Lima, Zito,Dalmo, Calvet, Gilmar, Mauro (acima), Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe (abaixo), timáximo de Lula.
A tal “sanfona” rolou em uma partida em que o Santos não atuava bem, principalmente a defensiva. Lula mandou a moçada recuar - sobretudo os ponteiros -, porque a via cansada. Com aquilo pretendia fazer o adversário atacar e deixar brechas lá atrás. Deu certo e o time venceu. Mas ele pareceu depois, envergonhado por jogar se defendendo. Justificou-se à mesma RevEsp: “Não usamos jogo defensivo. O Santos procura, sempre, agredir, e não se defender. Poderemos usar isso outras vezes, mas sem ficarmos presos ao sistema. Tudo vai depender do estado físico da rapaziada, da inspiração, enfim, de vários fatores”.
Por aquela época da “sanfona”, Lula dirigia o time santistas há 13 temporadas. Segundo garantia, o segredo da longevidade passava por trabalho de profundidade, sem procurar resultados imediatos, mas para o futuro. “O Santos tinha time médio quando o recebi. Planejei trabalho para ter resultados dentro de duas temporadas, tive tempo e sorte”, considerou – o Santos foi o campeão paulista de 1955.
Ao tornar o time Santista o mais forte do planeta, a partir de 1958, Lula assegurava não ter dificuldades para lidar com astros. Dizia que o segredo era se impor ao grupo, dentro e fora do gramado, era a eficiência do treinador, e não o gabarito da equipe.
Repórteres mais chegados ao grupo santistas falavam que Lula até gostava de trocar ideias com a rapaziada sobre a melhor forma de enfrentar cada adversário. Ele, no entanto, não confirmava isso, só que fazia preleções antes das partidas, por entender que, se fosse trocar opiniões o seu time entraria em campo sem definir o sistema de jogo, por ter 12 considerações diferentes. “Se sou o responsável pela equipe, decido como ela deve jogar”, fazia questão de falar. Se acrescentasse algo, seria pra garantir que, há 12 temporadas, o Santos não mantinha uma forma de jogar, sem esquema tático rígido. “O time entra em campo para cumprir as minhas ordens”, afirmava, mostrando-se vaidoso.
Em 1964, quando o Santos bateu o italiano Milan e ficou bicampeão intercontinental, a média de idade a rapaziada era de 27. Lula, porém, não valorizava idade cronológica, preferindo olhar para o que o atleta produzisse durante as partidas. E respeitava muito a experiência do comandado, como a de Jair Ross Pinto, o melhor meia-armador que dizia ter dirigido.
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