Vasco

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domingo, 18 de junho de 2017

DOMINGO E DIA DE MULHER BONITA - MARINA, A ESTRELA DA 'NOVELA SACOPÃ'

Parecia uma novela. Dos tempos em que a Rádio Nacional comovia o país inteiro, transmitindo dramalhões de arrepiar. Estrelando um roteiro real, uma linda e confusa garota disputada por um tenente e um bancário. Do outro lado do aparelho, ouvintes, cada vez mais ligados nos capítulos diários, apostando no que iria dar a cartada final.  
 A sinopse do início do texto apresentava Marina de Andrade Costa colada no ex-namorado Afrânio Arsênio de Lemos – servidor da agência de Botafogo do Banco do Brasil –, sem perder o contato com o seu primeiro amor e escrevendo-lhe dedicatórias apaixonadas e provocando o ciúme extremo de Alberto Jorge Franco Bandeira, oficial da Aeronáutica.
 Tudo em cima! Como mandava o figurino da época, para dominar a audiência, que estava lá em cima quando a sonoplastia do capítulo da noite de 6 de abril de 1952 usava o som do motor de carro deslizando pelo asfalto da Avenida Epitácio Pessoa, margeando a Lagoa Rodrigo de Freitas, parar pelas proximidades do Clube Caiçara. Seguem-se três tiros, o ouvinte fica sabendo terem atingido a cabeça, o hemitórax direito e o abdómen da vítima.
 Ninguém sai de perto do rádio. Ouve-se que que o assassino usara um revólver Smith Wesson, calibre 32, de carga dupla, e deixara 14 lesões na cabeça do coitado, produzidas por golpes sucessivos à coronhadas. 
O caso virou filme, em 1963
- Óoooooooh! – exclamavam os ouvintes, quando o capítulo era interrompido para a divulgação das propaganda da brilhantina Glostora, da cera Parquetina, do sabonete Eucalol e do colírio Moura Brasil.
 Decepções com os comerciais passadas, é após o “estamos de volta” do locutor que o ouvinte vive as maiores emoções do capítulo daquela noite. É narrado que, no dia seguinte, um Citroen peto parado e com os faróis acesos é encontrado na Ladeira do Sacopã, com um corpo caído lá dentro. Dentro da carteira da vítima, a foto de uma bonita morena tinha escrito no verso: “Este sorriso te pertence”.
- E, não percam, amanhã, neste mesmo horário, mais um sensacional capítulo desta novela escrita por Marina Costa, Afrânio Lemos e o Tenente Bandeira – diria o locutor, par amais um “Óoooooo!” da enorme audiência, por todos os rincões do solo pátrio.       

2 – Entra em cena o delgado Hermes Machado, do 2º Distrito Policial, de Copacabana e que, após seguir várias pistas, passa a crer que o tenente matara ao bancário. Chamado a depor, ela nega, afirmando que estivera, até tarde da noite do crime, na casa da avó, à Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo.
Também chamada a depor, Marina tenta inocentar o namorado. No dia seguinte ao crime, este surge em sua casa, pedindo-lhe para esconder o seu revólver e ordena-lhe bico fechado, sob pena de ser enforcada com uma echarpe, que seria apertada, vagarosamente, até ela ficar roxinha.
- Matei por sua causa – confessou-lhe o tenente.
Foto Divulgação do ator Alberto Jorge
 no filme de Roberto Pires
Assustada, Marina recorre ao advogado Plínio Moreira Lima, contando-lhe ter o militar lhe confessado o crime, ela feito declarações falsas à policia, por temer as suas ameaças, e pede um novo depoimento. Pede, também,  ao delegado Hermes Machado, um policial para protegê-la durante as 24 horas do dia, no que é atendida, recebendo um investigador morar em sua residência, passando-se pelo primo José, que anota todas as confidências do tenente, que já contratara o advogado Romeiro Neto, o principal criminalista do Rio de Janeiro.
Com evidências suficientes no caderninho, o delegado Hermes consegue, com o Tribunal do Juri,  em julho, a prisão do militar, guardado no Regimento de Cavalaria, na Avenida Pedro II. 
 Pouco depois, descobre-se que Bandeira tinha uma amante, a cearense Miriam, que lhe daria um filho.  Marina, enciumada, passa a telefonar para o quartel, prometendo ao tenente desmentir na polícia tudo o que dissera contra ele, o que cumpre.

3 - Dois anos se passam, Marina desentende-se com Plínio Lima e passa a ouvir Romeiro Neto, que aconselha viajar a Nova York, nos Estados Unidos, a fim de livrar-se do assédio dos repórteres. O caso já ganhara repercussão internacional, tendo as fotos dela e do tenente já sido divulgadas, inclusive pela famosíssima revista norte-americana “Time”.
 Enfim, o julgamento do tenente é marcado, para 26 de março de 1954. Os três milhões de habitantes do Rio de Janeiro só falavam do caso. Por não atender convocação judicial, na véspera, Marina é presa e levada para a Penitenciária de Mulheres, em Bangu. Para  a sessão do júri, chegou às 11h30, agitada, usando óculos escuros. Escoltado por um pelotão da polícia da Aeronáutica, Bandeira chegou 20 minutos depois dela. 

Foto Divulgação de cena do filme "Crime no Sacopã"
Eram 13 horas, quando o juiz Claudino de Oliveira Cruz abriu a sessão. Do lado de fora do Palácio da Justiça, a afluência popular era imensa, obrigando o trânsito a ser desviado para ruas laterais. Lá dentro, emissoras de rádio prendiam os seus ouvintes e batalhões de repórteres e fotógrafos disputavam espaços. Bandeira sentou-se no banco dos réus, entre dois tenentes-aviadores. A leitura dos autos durou oito horas. Após um intervalo para o jantar, a inquirição das testemunhas começou às 22 horas. A grande atração da novela, Marina, a pivô do crime, arrolada pela acusação, fora dispensada de depor, mas obrigada a ficar em uma sala reservada até o final do júri.

4 - A inquirição rolou até as 3h30 da madrugada. Às  04h, o juiz passou a palavra ao promotor Emerson Lima, cuja convicção de culpabilidade do réu foi reafirmada pelo assistente de acusação,  Milton Sales. Por ter o Lima passado mal, subitamente, os trabalhos foram retomados às 9h30, tendo a acusação pedido de 6 a 20 anos de prisão para Bandeira. Às 11h, os advogados de defesa, Romeiro Neto e José Bonifácio, entraram em ação, tentando invalidar todas as declarações de Marina à policia. Alegaram que a ameaça  de estrangulamento à moça fora “brincadeira” e que o cliente não fora acusado nos autor do processo, mas só caluniado.
Não adiantou. Às 13h10, os jurados foram para uma sala secreta e, às 1520, voltaram a plenário, para o juiz ler a sentença condenando Bandeira a 15 anos de prisão.
Em 1972, o julgamento foi anulado pelo Supremo Tribunal Federal, acusando falhas no processo. Bandeira foi reintegrado à Aeronáutica, em 1974, e reformado como capitão. Viveu até agosto de 2006, sem conseguir ser inocentado pela Justiça.  
Quanto a Marina, após a condenação de Bandeira,  ela desapareceu, deixando a história de que teria se casado com um comerciante italiano e passado a usar um outro nome.          

OBS: o caso Sacopã foi levado para o cinema, em 1963, filmado com direção de Roberto Pires. Entre outros, foram atores e atrizes: Alberto Jorge Franco Bandeira, Agildo Ribeiro, Jorge Dória, Iris Bruzzi, Maria Pompeu e Yolanda Cardoso.      


eremes Machado, do    

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