Da
última vez que encontrei-me com o grande intelectual baiano, Hildon Rocha,
cidadão barreirense e, também, jornalista e escritor, durante aqueles formais
“como vai?”, respondi-lhe: “Não tão bem quanto você, pois jornalista trabalha
muito e ganha pouco”.
Estávamos
no Lago Norte de Brasília, na casa do também barreirense Dílson Ribeiro, membro
da Academia de Letras de Brasília e amigo de Juscelino Kubitscheck.
Hildon sorriu e disse: “Você pode ganhar
pouco, mas tem uma riqueza nas veias. Por elas, passa o sangue que passou
pelas de Gilberto Freyre”.
Neste e no livro abaixo, o intelectual... |
Hildon justificou-se: “Onde nascemos (Bahia Oeste) já foi território pernambucano. Deixou de ser, devido entreveros políticos da Província com o Império. O sangue que jorrou nas veias de Gilberto Freyre é mesmo que circulou pelas da sua avó Gustava Amélia Wanderley, mãe do meu amigo Arnaldo Wanderley, seu pai. Pesquise!” – recomendou-me.
Não pesquisei, pois não estava interessado
naquilo. Tempos depois, lendo “Memórias Indiscretas”, que Hildon Rocha
escreveu, em 1981, para a Francisco Alves Editora, encontrei isso: “Gaspar Van der Lay
veio (da Holanda) para o Brasil, no século 19, e casou-se com uma filha da
família Mello. Desse encontro, uma Mello uniu-se a um Freyre, descendente de
espanhóis”.
O
Wan der Lay abrasileirou-se para Wanderley, mas ficou de fora da
descendência criada pelo professor Alfredo Freyre, com Francisca de Mello
Freyre, os pais de Gilberto. Mas algo muito mais importante do que isso
ficou de dentro das veias culturais nordestinas: a liderança intelectual de
Gilberto Freyre, gerando o “Manifesto Regionalista” – década-1930 –, inspirador de
romancistas e poetas, como Jorge de Lima, José Américo de Almeida, Graciliano
Ramos, José Lins do Rego, Jorge Amado e Rachel de Queiroz, entre outros.
Hildon Rocha não concordava comigo quando eu
lhe usava a linguagem do "ludopédio" nacional e dizia que Gilberto Freyre "chutara pra fora", dedicando, certa vez, parte do
seu tempo à política. Preferia entender que tivera “mandato parlamentar
prejudicial à sua atividade de escritor”. Pois bem! Como deputado, o sociólogo autor dos clássicos “Casa Grande & Senzala” e de “Sobrados &
Mucambos”, era tratado com indiferença pelos colegas, que preferiam as discussões
partidárias, razão pela qual não ele ia ao microfone. Entregava discursos escritos
para serem publicados pela mesa diretora da Câmara.
Além de admirador do grande pesquisador, Hildon
Rocha tinha, também, admiração por
um outro intelectual nordestino, Luís da Câmara Cascudo, do qual contou-me uma
história interessante: “Eleito deputado estadual, o
Cascudo só exerceu o mandato por três sessões, após a posse. No dia seguinte,
Getúlio Vargas tomou o poder e a “Revolução de 1930” levou à síncope as
assembleias estaduais e federal. Tempinho passado, já ditador, Getúlio o visitou, no Rio
Grande do Norte, e falou-lhe dos seus direito a indenização por
mandato interrompido. Ouviu como resposta: ‘Eu é que devo à sua revolução, presidente. Se o
senhor soubesse o bem que ela me fez!” – à cultura brasileira, evidentemente,
pois tivera mais tempo para pesquisar, do que para gastar com política.
barreirense manda o seu recado |
Sobre Ruy, jamais indaguei nada ao Hildon, pois não perco
o meu tempo com um sujeito preconceituoso, que apoiava ditadura (o que é o estado de sitio?) e achava-se melhor do que muita
gente, recusando-se a embarcar no mesmo transporte. E o pior: advogava para
um inglês que foi o maior picareta estrangeiro que já pintou por estas plagas – ainda bem que está sendo esquecido. Nélson Rodrigues, o maior teatrólogo que já tivemos, também tinha pavor dele.
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