Vasco

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domingo, 19 de outubro de 2014

O VENENO DO ESCORPIAO - A FOTONOVELA

  As fotonovelas italianas vendiam bem no mercado brasileiro. Mas eram muito caras. Então, o “Titio” Adolpho Bloch – como os empregados da Editor Bloch o chamavam –  resolveu produzir as dele. Nos meios de papos com a sua galera do departamento financeiro, alguém sugeriu-lhe falar com o amigo Roberto Marinho e contratar atores menos famosos da TV Globo a preços mais baratos, para não deixar a revista Sétimo Céu parar com as fotonovelas. O Doutor Roberto, liberou campo livre e a galera de menos  fama, pra morder uma graninha por fora, levava até as roupas usadas nas gravações globais.

– Adolpho! É até um favor que você me faz. Esta moçada vive me chamando pão-duro, reclamando da holerite. Não posso lhes pagar o que ganham Tarciso Meira e Regina Duarte, que levantam minha audiência, me rendem muita publicidade. Acerte com eles – respondeu o “Doutor” Roberto Marinho, que havia sido repórter de jornal e conhecia bem todos as choradeiras de quem vivia reclamando do salário.

La bela hermana Irma Alvarez
Começou, então, La bela hermana Irma Alvarez a Editora Bloch as suas produções com os “menos famosos” da Globo, para a revista Sétimo Céu. Lá pelas tantas, um produtor achou de fazer uma novela com uma atriz famosa. E sugeriu Irma Alvarez, que havia estrelado, em 1957, a primeira fotonovela feita nesse país e que faria o papel de moça pobretona atropelada por um ônibus que a deixava paralítica mas, mesmo assim, o namorado decidia se casar com ela.

Irma Alvarez era uma morenaça argentina que apaixonara-se pelo Rio de Janeiro e naturalizara-se brasileña. Sonhada, paquerada por dez em cada nove cavalheiros brazucas, causava pânico quando desfilava de biquíni, em 1959, durante programações do Hotel Copacabana Palace. Era paparicadíssima pelo maior diretor de shows cariocas – Carlos Machado –  e pelos grandes diretores cinematográficos da década-1960 – Paulo César Saraceni, Domingos de Oliveira, Jece Valadão, Bruno Barreto e Roberto Farias -,  tendo, com Gláuber Rocha, atuado em sua obra prima, Terra em transe, de 1967.  Antes, em 1962, trabalhando em Porto das Caixas, fora eleita melhor atriz do ano - na TV, brilhou desde 1963.

Rola o tempo. Convencido o “Titio” a liberar a grana para a contratação da hermana, a produção da novela negociou com as autoridades do trânsito carioca para desviar os automóveis de uma parte da Avenida Niemeyer, no Leblon. Conseguido isso,  escalaram os fotógrafos Nílton Ricardo e Gervásio Baptista, para dois não deixar estourar o tempo tratado com o pessoal do DETRAN.

 Foi, então, a moçada  para o fechamento da produção. Os fotógrafos encheram a cara da atriz de um sangue composto por anilina, glicerina e chocolate, para obtenção de melhor qualidade nas fotos do acidente, e rolou  fotografagem. Rapidão, o local ficou repleto de curiosos, não demorando até mesmo a aparecer uma ambulância do Hospital Souza Aguiar, que passava por perto e foi chamada pela moçada que curtia o trabalho da rapaziada do "Titio".

Até ali, nada de menos, ou de mais. Só que, ao saber do que se travava, a moçada da ambulância ficou uma fera, achou ter sido feita de palhaço e partiu para o maior bate-boca com a turma da fotonovela. Nisso, a bela  Irma Alvarez vai se levantando do chão, deixando as coxas, generosamente, ao deleite da galera, que ficou estática, com os olhos pregados em sua calcinha. Ameaças e xingamentos cessados, pelo lance da peça íntima da hermana, o fotógrafo Gervásio Baptista falou pra moça:

– Irma! Eu já contava ter os meus dentes quebrados pelos enfermeiros, mas a sua calcinha branquinha salvou a minha cara - ao que ela contra-atacou: "Pois quem vai quebrar os seus dentes, agora, sou eu, seu indecente".

E entre  dentes, calcinhas e indecências, em pé de guerra, ainda deu pra fotografar o final da fotonovela, com um beijo entre a atriz famosa e o modelo Jefferson Dantas (ator principal da trama).

     OBS: ESTA HISTÓRIA ME FOI CONTADA POR GERVÁSIO BAPTISTA

Texto publiado pelo Jornal de Brasília de 04.05.2025 e trazido para cá pelo Túnel do Tempo.

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