Vasco

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sábado, 17 de novembro de 2018

O VENENO DO ESCORPIÃO 100 - CORDEL, O RECADO DE FIGURINHAS ESTREPOLIENTAS

Lotação do inferno esgotou
SACANINHAMENTE, 'ENGRAÇADÉRRIMO'
Esta é um tipo de poesia popular, muito prestigiada pelos nordestinos, mas que só ganhou consideração mais ampla por volta de 1955, quando Orígenes Lessa escreveu, perto do Natal, um artigo tratando das estrepolias de personagens desconhecidos pelos leitores da revista Anhembi. 
 Contribuiu muito, também, para o reconhecimento do valor cordelista um artigo do estudioso francês Raymond Cantel, em junho de 1969, nas páginas do jornal parisiense “Le Monde”. Foi o que ajudou impulsionar o cordel na direção do reconhecimento dos estudiosos “brasucas”.
 Chamados, também, por folhetos de trovadores, ou, simplesmente, folhetos, os cordéis trazem, geralmente, oito páginas, no tamanho 11 x 16 centímetros. Mas há casos em que apresentem 16, ou 32 folhas, se a história for maior.
O termo cordel tem origem erudita, com influência portuguesa e com autores se autodenominando trovadores. Sua literatura existiu em vários países, entre eles a França, até o século 19. Em Portugal e Espanha vingaram pelas primeiras décadas do século seguinte. Há exemplares até do século 15.
 No Brasil, tudo leva a crer que os primeiros exemplares foram impressos pelo final do século 19, atribuindo-se o pioneirismo a Leandro Gomes de Barros e a João Martins de Atahyde. Por aqui, prevalece a prosa, preferentemente, na chamada redondilhas maior, versos de até sete sílabas contadas até a última tônica. Usa-se, também, a sextilha, ou versos de “seis pés”, com as rimas aparecendo nos segundo, quarto e sexto “pés”.
"Diabetes" do Roberto compraram tudo
 Durante a década-1960, os cordelistas andaram muito antenados ao que rolava. Por exemplo, Minelvino Francisco Silva viu as meninas colocarem os joelhos de fora e lançou “A Moda da Mini-Saia” e “A Garota Brasa Viva”, pegando o embalo da Jovem Guarda da turma de de Wanderléa.
 De sua parte, Apolônio Alves dos Santos preferiu ir direto ao “Rei” da música jovem, escrevendo “A mulher que rasgou o travesseiro e mordeu o marido sonhando com Roberto Carlos”.
 Roberto Carlos, por sinal, visitou a literatura de cordel em várias outras oportunidades, sacudindo o setor. Movido pela estrondosa “Quero que vá tudo pro inferno”, que dominou todas as paradas de sucesso de 1965 e entrou por 1966 na ponta, Enéias Tavares Santos. publicou “Carta de Satanás a Roberto Carlos”.
Viajava ele, a borde de um ônibus, entre Maceió a Aracaju, quando um radio começou a levar-lhe a canção aos oritimbós. Achando o que ouvia muito interessante, ao descer em Sergipe, só precisava colocar no papel os versos bolados durante a viagem. Por eles, virara uma agrura a vida do “Sáta”, informando ao cantor já estar o inferno superlotado. E cobrava-lhe: “Você ganhando dinheiro/E eu ficando lascado”.
Se Satanás ficava “durango kid”, o poeta Enéias fazia o contrário. Seu cordel vendeu tanto que ele pôde pagar tudo o que devia na praça. Negociou direitos de publicação com a antiga Editora Prelúdio (atual Luzeiro) e a divertida historinha é editada há quase meio-século. Mais? A carta de Satanás foi tão bem endereçada ao povão, que levou um outro cordelista, Manoel D´Almeida Filho, a também morder uma graninha, vendendo às diabetes “Resposta de Roberto Carlos a Satanás”;  “A chegada de Roberto Carlos no Céu” e ”Roberto Carlos no Inferno”.
O maior clássico, o mais vendido
 No entanto, o livrinho que mais vendeu e é considerado o “cordel dos cordéis” foi titulado por “Pavão Misterioso” e tem autoria discutida. 
Há vários pesquisadores sustentando que o poeta José Camelo de Melo Rezende, de Pilõezinhos, na Paraíba, o teria escrito, em 1923, enquanto outros afirmam o texto publicado não é mais o original, mas versão de história escrita por João Melchíades Ferreira, que o teria ouvido de um outro cantador.
E não fica por aí. Os direitos autorais são reivindicados pela Editora Luzeiro e questionados pelo poeta cearense Vidal Santos. Ademais, haveria um texto original de José Camelo, mas não se conhece ninguém que tenha o livro.
 Pra piorar: o texto não conta nada sobre uma ave, mas uma máquina desenhada e desenvolvida na oficina de um engenheiro - coisas da ficção.


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