Vasco

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sábado, 25 de março de 2017

KIKE EDITORIAL-16, OU O VENENO DO ESCORPIÃO - COLANTE ESCANDALOSO

Pelo virada do século 19, quando as cariocas iam à praia, vestiam roupas de banho largas, não deixando nenhum vestígio de como seria o seu corpo. Só quando entravam na água colocavam um cinto no roupão e a sua cintura dava o recado.  Quando iam sair do mar, é claro, logo tiravam o dito cujo “entregador”. Mas nem todas se misturavam aos rapazes no mesmo horário de ir às praias da moda – Flamengo, Russel, Glória e Boqueirão do Passeio. Só as mais ousadas. Isso, no entanto, não valia par a atriz teatral Hermínia Adelaide. 
Em daqueles domingos em que um dos programas tradicionais da rapaziada era “grelar” a saída das moças da  missa das 10 da manhã,  Hermínia Adelaide aparece na praia do Flamengo, usando roupa  de banho coladinha ao corpo, desenhando as suas formas e avisando que tinha seios redondinhos. Parou a praia. Um escândalo! Mães viravam os olhos e pais faziam que faziam o mesmo, tentando, é claro, disfarçar uma  espiadinha pelo rabo dos olhos. Súbita aparição que levou muitos rapazes ao teatro, na noite de domingo, no Recreio, onde ela se apresentava. E foi por ali que as revistas “O Malho” e “Fon Fon” começaram a estampar fotos femininas em roupas de banho, para deleite dos paqueras.   
Corria 1898 e o Brasil vivia o governo do presidente  Manuel Ferraz de Campos Sales, que substituiu Prudente de Morais e ficou no cargo, até 1902, consolidando os interesses das oligarquias rurais, sobretudo dos cafeicultores paulistas.
Na vida cultural da capital do país, o Rio de Janeiro, em 19 de junho daquele 1898, Afonso Segreto chegava da Europa e filmava a Baía de Guanabara, o que é considerado o primeiro filme feito no país. Antes disso, em fevereiro, Hermínia Adelaide estreava a peça “O Jagunço”, de Arthur Azevedo, contracenando com  Blanche Grau e Arthur Louro, entre outros.
Hermínia Adelaide estava nos palcos desde 1885, quando participou da peça “Cocota”. Em 1896, estreou um texto de da parceria Arthur Azevedo/Moreira Sampaio, “O Bilontra”, tendo Blanche Grau e Arthur Louro, novamente, do seu lado no Teatro do Recreio, além de gente de nome, como Elisa de Castro, Rose Villiet e Angelo Agostinelli. Em 1889, ela estava fazendo “Bendengó”; em 1899,  “O Buraco”, um outro texto de Moreira Sampaio, em nova parceria com Elisa  de Castro, e, em 1919, “Babaquara”.
O Rio de Janeiro de Hermínia Adelaide tinha um clima propício para atividades ao ar livre. Quando ela ia ao mar, para deleito dos rapazes que fundavam o Grupo de Regatas do Flamengo, a praia era um espaço muito democrático e a classe burguesa se formava no país. Surgiam as primeiras cobranças de uma não constante imprensa feminina, defendendo para elas o direito ao voto, à educação profissional e a liberdade de decidir sobre o seu corpo. Entre 1860 a 1880, moças que se prezavam só deveriam usar o mar antes do sol chegar, sem rapazes por perto. 
No início de 1913, o Jornal do Brasil publicou matéria projetando como seriam as cariocas naquela temporada, e sugeria-lhes praticar alguma modalidade esportiva capaz de aperfeiçoar-lhe as belezas físicas e apurar-lhes as “linhas esbeltas e vigorosas” – o que Hermínia Adelaide já exibia, desde 1895, sexyzada por roupa colante em um corpo que estava 20 anos à frente.

 

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