Vasco

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sábado, 24 de outubro de 2020

O VENENO DO ESCORPIÃO - O ALEMÃO "DESMARAVILHOSO" DO SEU ARLINDO

 Uma das figuras mais interessantes do meu Rio de Janeiro era (ainda é, pois segue vivo) o garçom Arlindo, do Bar Garota de Ipanema (antigo Veloso), o cara que atendeu telefonema de Frank Sinatra, querendo falar com Tom Jobim. Ele sabia de tudo e da vida de todos, em Ipanema. Não que bisbilhotasse, mas porque a galera do bairro lhe contavam. De sua parte, só fazia ouvir e arquivar na memória.

A reportagem em que o Arlindo
 anuncia o seu fim de linha como garçom  

 Por inteiro acaso, fiquei amigo do Arlindo e, sempre, que eu ia ao RJ (como repórter), passava pelo Garoto, pra almoçar, jantar, beber um chopinho e ouvir as suas histórias. Tive a sorte de ele me escolher pra publicar um furo de reportagem, a sua aposentadoria, o que chocou a boemiada carioca e está nas páginas do caderno de Cultura do Jornal de Brasília.

 Das tantas histórias que este cara (que não aceitava eu chamá-lo por Seu Arlindo) me contou sobre a Cidade Maravilhosa, uma era desmaravilhosa, sobre um "alemão". Confira:    

 De acordo com o Arlindo, o "alemão" (na verdade, suíço, segundo pesquisou o meu amigo  jornalista Zildo Dantas); bonitão; paqueradíssimo pelas gatas de Ipanema; doutor (na verdade, graduado em Desenho Industrial); falava várias línguas (alemão, inglês francês e português) e tinha o apelido de Vovô  (por ser loirão, com os cabelos parecendo brancos). Amigo de copo do Tom Jobim, quando este foi para os Estados Unidos (em 1967, gravar o LP Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim), enviou-lhe um cartão postal, aos cuidados do Bar Veloso (que já se chamava Garota de Ipanema), pois jamais soubera onde o cara residia.


Arlindo, que já havia atendido telefonema de Frank Sinatra, recebeu o cartão e juntou mais esta à sua coleção de histórias. Pelo me contado, o Vovô esquecera-se do endereço do trabalho e só se lembrava da mesa do bar em que bebia com os chegados de Ipanema. Demitido do emprego, passou a viver de bicos. Lá pelas tantas, virou esmolé. Nesse ponto, Arlindo ressalva que uma amiga de boteco tentou recuperá-lo, tirando-o das calçadas das ruas. Mas não adiantou. Ele voltou pra lá, estendendo as mãos, pedindo dinheiro pra rapazes e garotas que passavam à caminho da praia, onde dormia, muitas vezes.

                                                         Foto que cliquei do Arlindo e a                                                                                                                   minha mulher, em 2011, diante 

                                                    do Bar Garota de Ipanema, em 2011

Por aqui, entra a desmaravilhosa história do cara que, quando tocado sobre o tema, conversava como se fizesse conferência sobre mágicos das telas e da arquitetura europeia. Andando descalço e com os pés inchados, um dia, em 1995, ele apareceu na Praça Nossa Senhora da Paz, por lá deitou-se no chão e não acordou mais.    


 Como o Arlindo não sabia do nome verdadeiro do Vovô, pedi ao meu amigo jornalista Zildo Dantas, que morava perto de Ipanema, pra tentar descobri-lo. E o Zildo o descobriu, conforme me disse, por uma crônica do grande jornalista/pesquisador Ruy Castro. O alemão do Arlindo, tetrapoliglota e proprietário de canudo de curso superior, chamava-se Raul Gunther Vogt. Não encontrei nada sobre ele, vasculhando a Internet. Portanto, agradecimentos aos Arlindo, Zildo Dantas e Ruy Castro.


OBS: no sábado 10. l10.2020 publiquei, aqui no VENENO, uma outra história de Ipanema me contada pelo Arlindo, sobre um padre que detestava esmolas e dizia que Deus tinha que se virar, ser empresário. Duca!

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