Vasco

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sábado, 10 de outubro de 2020

O VENENO DO ESCORPIÃO - O PADRE POP DE IPANEMA ERA O MINEIRO BALESTIERI

 Em 1961, o Concílio Vaticano II, que rolou até 1965,  abriu as portas das igrejas católicas para a música popular. Em 1963, a juventude brasileira ouvia, pela primeira vez, a música dos Beatles, em LP trazido pela artista gráfica Bea Fleiter, carioca que estudava desenho, em Nova Iorque e, em 1962, assistira e adorara show, na alemã Hamburgo, dos rapazes de Liverpool.

 Estava aberto o caminho para o iê-iê-iê dominar o gosto da brazucada.  Nem só, no entanto, dos jovens, que só queriam namorar  as mais lindas garotas de Ipanema. Nesse rolo se meteu, também, um pastor de almas que viu na novidade musical um bom meio de turbinar o seu pedaço de evangelização.

Nascido na fria Santa Catarina, ele tinha mais dois irmãos a serviço do Altíssimo, mas alma do carioca sempre presente na onda da hora. Chamava-se (frei) Leovigildo Balestieri (vivido entre  1910 a 1979,  desde 1939 em Ipanema), imaginou um meio de competir com as ondas do mar , em manhã de domingo de verão: convidou The Brazilian Bitles para tocar durante culto na Igreja de Nossa Senhora do Rosário (foto abaixo), da qual era pároco – em frente à ipanemense Praça Nosssa Senhora da Paz.

 Era agosto de 1966 e a ideia do Balestierei arrombou a missa e deixou muitos jovens do lado de fora do templo superlotado - antes, Fabio Bloch (baixo e guitarra), Vitor Trucco (guitarra solo e baixo); Luiz Toth (bateria); Jorge Eduardo de Almeida (voz e guitarra base) e Elizeu (Ely) da Silva Barra (voz e teclados)  já haviam tocado a Ave Maria, de Schubert, em ritmo balada, durante festa em Teresópolis-RJ.

A missa foi um escândalo e ganhou bom espaço na imprensa, principalmente porque o (virado) padre pop (Balestieri) tivera com ele, no altar, mais dois colegas de Curitiba, Emir Calluf  e Euvaldo Andrade, este capelão da Base Aérea local.  O primeiro assustara o Vaticano, levando a banda Os Águias para tocar adaptados (ao cristianismo)  sucessos da onda jovem, o que o arcebispo curitibano, Dom Manuel da Silveira Elboux considerou (missa&rock) atividade profana, e o segundo fora repreendido pelo seu comandante, o Brigadeiro Peralva, por levar o iê-ie-iê pra dentro da Ditadura.

O padre pop, com tal atitude, abriu caminho para, em maio de 1967, um outro religioso da onda, o carioca padre Antônio Curti, incentivar o conjunto “Os Átomos”, formado, inicialmente, por Congregados Marianos. 

Era, mesmo, uma brasa, o frei Balestieri. Em 1965, pioneiramente, ele colocou ar condicionado em sua igreja, um também escândalo que ele diluiu, dizendo às beatas que quem gostava do calor era o diabo,  no inferno. 

 Diferentemente de todos os padres que se conheciam, Balestieri abominava esmolas em sua paróquia. Pregava que Deus deveria ter espírito empresaria, captar recursos - mais um escândalo. Sem ligar para críticas, danou-se a fazer comércio, com fábrica de azulejos, espaço para patinação e jogo de boliche, hotelaria, turismo,  trady caompany, teatro de arena e até cinema, o Cine Pax, que marcou época em Ipanema e rolou até 1970, quando passou o seu último filme (À procura de Mister Goodbar) – o lugar é ocupado,  hoje, peloForum de Ipanema, ponto de moda para quem tem dinheiro sobrando.

 O frei Balestieri tomou partido político, também, quando era uma grande figura de Ipanema (foto reproduzida de wikipedia). Fez discurso, dentro da sua igreja, contra a ameaça comunista e foi um dos que deram nome à Marcha da Vitória, em 2 de abril daquele turbulento - meia-quatro, no Rio de Janeiro, juntamente com o engenheiro Glycon de Paiva e o general Golbery do Coputo e Silva, apoiados por Amélia Molina Bastos, irmã do general Antônio de Mendonça Molina, da área de informação e contrainformação do Exército.

Em São Paulo, a marcha fora pensada pelo deputado federal Antônio Sílvio Cunha Bueno, do Partido Social Demodcdrático, inspirado nas pregações do padre irlandês anticomunistas Patrick Peyton,  fundador do movimento Cruzada do Rosário pela Família. Ao pedir apoio ao empresário Laudo Natel (futuro govenrador paulista nomeado pela Ditadura), Bueno foi recomendado a procurar a freira Ana de Lourdes, neta de Ruy Barbosa, para arregimentar lideranças femininas.  Ana via ameaças ao catolicismo, no discurso do presidente João Goulart, mas respondeu que não era com o “Rosário de Maria que se deveria combater as ameaças à fé cristã”.

Se tivesse dito isso para o frei Balestieri,  que apoiara a proposta carioca, no mínimo, ele a faria rebolar em seu teatro de arena. Afinal, mesmo sendo operador (político e comercial) de Deus, ele estava, sempre, pronto pra se reunir com o diabo e discutir algum tipo de investimento – se possível, ao som de  Quero que vá tudo pro Inferno. 

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