Seleção vestiu azul e trouxe o caneco do estrangeiro.
Enfim, a Confederação Brasileira de Desportos mudara tudo o que fizera (de errado), antes, para preparar uma seleção. Mas, pra variar, não deixou de levar, na bagagem, um pouquinho de desorganização. Por exemplo, não numerou os atletas. Ficou a história de que isso teria sido feita, aleatoriamente, por um uruguaio membro do Comitê Organizador da FIFA. No entanto, o ponta-esquerda Zagallo conta que a numeração das camisas coincidia com o número das malas com que cada um jogador viajou.
Em declaração ao site oficial da Copnfederação Brasileira de Futebol (CBF), o Lobo contou: “Havia uma numeração nas malas de viagem. Me lembro que me deram uma com o o número 7. A do Pelé era a 10”. Assim, teria ficado esta estranha numeração: Gilmar (3); Castilho (1); Djalma Santos (4); De Sordi (14); Bellini (2); Mauro (16); Orlando (15); Zózimo (9); Nílton Santos (12); Oreco (8); Zito (19); Dino (5); Didi (6); Moacir (13); Garrincha (11); Joel (17); Vavá (20); Pelé (10); Zagallo (11) e Pepe (22).
Incluídos no fortíssimo Grupo 4, os “canarinhos” estrearam, em 8 de junho, vencendo a Áustria, no estádio Rimmewallen, em Uddevalla, por 3 x 0, com um futebol elegante, prático, deslumbrante. Mazolla, aos 38 minutos do primerio tempo, e aos 35 do segundo, e Nilton Santos, aos 4 da fase final, fizeram os gols.
Para estrear, o treinador Vicente Feola não tinha muita confiança em Pelé e Garrincha, por vê-los muito jovens. Inovando, taticamente, com o 4-2-4, que variava, para o 4-3-3, Feola abandonou o 2-3-5 dos Mundiais passados, e deixou, também, Djalma Santos, Zito e Vavá na reserva. O Brasil jogou com: Gylmar; De Sordi, Bellini, Orlando e Nílton Santos; Dino Sani e Didi; Joel Martins, Mazolla, Dida e Zagallo. A Áustria, do técnico Karl Argauer, foi: Szanwald; Halla e Happel; Swoboda, Hanappi e, Köller; Senekowitsch, Buzek, Koerner e Schleger.
INGLESES - Em 11 de junho, em Goteborg, a Seleção Brasileira esbarrou no goleiro inglês McDonald, que segurou o primeiro 0 x 0 da história das Copas. Do time da partida anterior, só Dida perdeu a vaga – para Vavá. O placar fora visto como alerta, pois, pelo que se comentava, o pior estaria por vir, diante da temível equipe que usava camisas vermelhas, com as letras CCCP (União as Repúblicas Socialistas Soviéticas) no peito. Era o time campeão olímpico de 1956, e, segundo diziam, programado, pelo cérebro eletrônico (atual computador). Só que Mané Garrincha – substituíra Joel – nunca ouvira falar daquilo.
Além de Garrincha e Zito, que barrara Dino Sani, o escrete canarinho teve, ainda, a estreia do garoto Pelé, de 16 anos. Por sinal, esta escalação – e a do Mané – é uma das histórias mais contadas do futebol brasileiro. Enfim, rolou a bola e, em poucos minutos, com duas jogadas praticamente iguais, Mane Garrincha “descadeirou” os adversários e deixou Vavá na cara do gol, só para fazer 2 x 0 e acabar com tanto mistério sobre os chamados russos, que ficaram com a segunda vaga da chave, vencendo a Inglaterra, por 1 x 0, em um jogo extra, após 2 x 2 na primeira partida.
Alemanha, Brasil, França, Irlanda do Norte, Iugoslávia, País de Gales, Suécia e União Soviética foram os classificados às quartas-de-final. Surpreendentemente, Inglaterra e Áustria, bem mais superiores a irlandeses e galeses ficaram de fora.
E veio a nova etapa. Em 19 de junho, o Brasil encontrou sérias dificuldades pra vencer Gales, por 1 x 0 – primeiro gol de Pelé na Copa. A tática do adversário foi, de saída, atacar forte, para tentar marcar um gol e segurar a vantagem, depois. Sem seu astro, John Charles, não funcionou. E a modesta zebra britânica, apresentando uma resistência jamais vista, terminou bombardeada pelo time brasileiro, permitindo ao goleiro Kelsey repetir McDonald.
Como as redes não balançavam, os brasileiros começaram a se enervar. Porém, os 25 minutos do segundo tempo, de calcanhar, Didi lançou Pelé. De costas para as traves, o garoto santista, de 17 anos, levantou a bola sobre a cabeça do zagueiro central Willians, aplicando-lhe o chamado “chapeu”. Pelé girou contra o marcador, com incrível velocidade e, antes que a bola caísse ao chão, chutou-a, para a rede. Belíssimo gol, que colocou o Brasil nas semifinais, ao lado de Alemanha, França e Suécia, que venceram, respectivamente, aos iugoslavos, por 1 x 0; aos norte-irlandeses, por 4 x 0, e aos soviéticos, por 2 x 0.
A Seleção Brasileira que venceu Gales foi: Gylmar; De Sordi, Bellini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi;Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo.
OS TEMÍVEIS FRANCESES - Este foi o jogo quer marcou o encontro de dois mestres do futebol, o brasileiro Didi (foto/E) e o francês Kopa. A tarde de 24 de junho, no estádio Rasunda, em Solna, perto da capital Estocolmo, estava reservada para o duelo entre os melhores ataque e defesa do Mundial de 58 – a França havia marcado 15 gols e o Brasil não sofrido nenhum. Para motivar ainda mais o seu time, os adversários levaram até as esposas dos jogadores para assistirem à partida.
E deu o que se esperava. Os primeiros 20 minutos foram os melhores do futebol naquela Copa, com lances vibrantes e jogadas rápidas. Com dois minutos, Vavá penetrou, pelo centro e, quase da pequena área, abriu o placar. Os brasileiros notaram que a defesa francesa não correspondia à categoria do seu ataque. Os franceses não se abateram e empataram, seis minutos depois. Kopa fez um lançamento longo, sob medida, para Fontaine, num espaço onde De Sordi e Nílton Santos deveriam barrá-lo. Rapidíssimo, o goleador venceu Bellini e Gilmar e balançou a rede.
O Brasil voltou a passar na frente do placar, aos 29, com Didi (foto) mandando um chute, de curva, a 40 metros de distância do gol, na chamada gaveta. Aconteceu minutos depois da contusão de Jacquet, num choque com Vavá.
Para o apoiador Zito, não fora a contusão de Jonquet o motivo da queda da produção do time francês, após o segundo gol brasileiro. Ele garante que, naquele dia, o Brasil ganharia de qualquer time. Jonquet, por sinal, errara, no tento que movimentara o placar, entregando bola dominada a Garrincha. Ele chegou a aplicar um carrinho, para recuperá-la, mas Zito pegou a sobra e lançou Vavá, que não perdoou.
Naquele dia, Bellini conseguiu anular o mais perigoso dos atacantes adversários, o artilheiro Fontaine, que já balançara as redes por oito vezes, e houve, ainda, um gol canarinho anulado, por um bandeirinha, erradamente,quando Zagallo chutou e a bola bateu numa das traves e, dentro do gol, atrás do goleiro Abbes. Mais? O zagueiro Kaelbel cometeu um pênalti claro, sobre Garrincha, não marcado pelo árbitro.
O terceiro gol surgiu de uma falha clamorosa de Abbes. Nilton Santos cruzou, da esquerda, o goleiro saltou para a defesa, mas entregou a bola nos pés de Pelé, aos 7 minutos do segundo tempo. Pelé faria, ainda, o quarto e o quinto, aos 19 e aos 30 minutos. No penúltimo, pegando um estouro de bola de zaga francesa e mandando a bola, pelo alto, à direita de Abbes; no último, após uma troca de passes: Zito, Didi, Pelé, Zagallo, Zito, Didi e, finalmente, Pelé. Aos 38, a França encerrou o placar, em 5 x 2, com um gol de Piantoni. Tudo aquilo acontecera numa mesma tarde em que os suecos venceram os alemães, por 3 x 1, classificando-se, também, para a final.
A Seleção Brasileira jogou com: Gylmar; De Sordi, Bellini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo. A França foi: Abbès; Kaelbel, Jonquet e Lerond; Penverne e Marcel; Wisnieski, Fontaine, Kopa, Piantoni e Vicent. O jogo foi assistido por 27.100 pagantes e apitado por Marvyn Griffiths, do País de Gales.
O Mundial da Suécia foi o primeiro com quatro grupos de quatro equipes, todas jogando entre si, para sobrarem duas para as quartas-de-final, entre oito representações. Depois, quatro fariam as semifinais. Como o regulamento não premiava o saldo de gols, na primeira fase, houve três jogos de desempates.
SOB O MANTO DE NOSSA SENHORA - Com Djalma Sntos substituindo o contundido De Sordi, a Seleção Brasileira – na foto, Djalma Santos, Zito, Bellini, Nílton Santos, Orlando e Gylmar, em pé, da esquerda para a direita; Garrincha, Didi, Pelé, avá e Zagallo, agachadosd, na mesma ordem – foi avassaladora contra os suecos, cujos grandes cartazes eram Gustavsson, Liedholm, Hamrim e Skoglund, que jogavam no futebol italiano. O time do técnico Vicente Feola mostrou ímpeto e técnica raros. Tanto que o susto pela abertura do placar, por Lindholm, aos três minutos, não pesou tanto. Aos nove, Vavá empatou – e desempatou, aos 32.
Com 2 x 1 de frente, no primeiro tempo, os brasileiros voltaram mais acesos, para a etapa final. Pelé fez 3 x 1, aos cinco minutos, emudecendo a platéia sueca, com uma belíssima jogada. Passados 13 minutos, Zagallo aumentou, para 4 x 1. Maravilhada, a torcida anfitriã passou a aplaudir, ensurdecedoramente, os adversários, que tiveram todas as suas jogadas bonitas saudadas, efusivamente.
A Suécia, ainda, marcou um tento, aos 35 minutos, por intermédio de Simonsson. Mas Pelé fechou o placar, em 5 x 2, no último minuto, gerando mais uma história interessante daquele Mundial: quando viu os atletas comemorando – logo em seguida ao tento, o árbitro francês Maurice Guige apitara o final da partida – Vicente Feola achara que a festa era pelo gol. Era uma comemoração dupla.
Instantes depois, dentro do estádio Rasunda Solna, em Estocolmo, diante de 49.800 pagantes, o presidente da FIFA, o inglês .. Drewery proclamou o Brasil campeão mundial de futebol e chamou o capitão Bellini para receber a taça de ouro puro, com 1,8 kg, pesando, no total, 4 kg. Confeccionada por Abel Lafleur, media 30 centímetros de altura, desde a base de mármore em que a vitória alada se apoiava, levando em suas mãos, levantadas sobre a cabeça, um vaso octogonal, em forma de copa.
Aplaudido intensamente, Bellini (fotos) inovou. Para atender aos fotógrafos, ergueu a Taça Jules Rimet, um gesto que seria imortalizado, dali por diante. E o Brasil passava a ter o seu nome inscrito, nas placas especiais da base da vitória alada, ao lado de Uruguai, Itália e Alemanha.
Ainda maravilhados com o futebol dos novos campeões, os suecos não arredavam os pés do estádio. Ouviram o hino nacional brasileiro, enquanto o sol aparecia em Solna, como se quisesse “associar-se à magnífica festa de consagração do futebol brasileiro, como o melhor do mundo”, conforme escreveu o redator da extinta Revista do Esporte, sem deixar de ressaltar ao choro do capitão Bellini, “que abaixou a cabeça, para ocultar as lágrimas que lhe corriam, fartamente, pelo rosto”.
Naquele momento, era emoção do tamanho do futebol jogado pelo time de Vicente Feola. Gilmar encostava o rosto ao peito de um companheiro. “Didi e Djalma Santos, como duas estátuas de ébano, se mantinham eretos, firmes”, contava a mesma revista, mencionada acima, segundo a qual os dois campeões, “pelo movimento convulsivo dos seus ombros, faziam extraordinário esforço para não mostrar os seus prantos”. Enquanto isso, Pelé não escondia nada. Abaixava a cabeça e chorava, copiosamente. Até o durão Zagallo soluçava, convulsivamente.
Antes que os primeiros campeões mundiais fora de seu continente dessem a volta olímpica – carregando a bandeira nacional –, o Rei da Suécia, Gustavo Adolfo, desceu da tribuna de honra e foi ao gramado, saudá-los. Ao ver a bandeira brasileira, ele disse: “Honrastes vossa pátria e soubestes defendê-la, muito bem. Não só mereceis este triunfo, por haver sido os melhores, mas porque o vosso comportamento foi o de verdadeiros atletas. Em nome do meu povo eu vos digo que estamos contentes por vossa vitória e orgulhosos por termos sido vossos rivais” – um dia antes, a França vencera a Alemanha, por 6 x 3, em Goteborg, e ficara com a terceira colocação.
Diferentes de outros sul-americanos, que adoravam erguer os braços para o alto e exibir a camisa, os jogadores brasileiros comemoraram, com pulos e abraços, dentro do gramado, sem histerias. Cavalheiros, os jogadores suecos abraçaram todos os atletas brasileiros, o que lhes valeu fortes aplausos.
Brasil campeão do Mundo: Gilmar; Djalma Santos, Bellini,Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo (foto). Suécia vice: Svensson; Bergmarck, Gustavsson e Axbom; Borjesson e Parling; Hamrim, Gunnar Gren, Simo, Liedholm e Skoglund. A final foi assitida por 49.737 pagantes e teve a arbitragem do francês Maurice Guigue.
TODOS OS RESULTADOS – Irlanda do Norte 1 x 0 Tcheco-Eslováquia; Alemanha 3 x 1 Argentina; Argentina 3 x 1 Irlanda do Norte; Tcheco-Eslováquia 2 x 2 Alemanha; Tcheco-Eslováquia 6 x 1 Argentina; Irlanda do Norte 2 x 1 Tcheco-Eslováquia; Iugoslávia 1 x 1 Escócia; França 7 x 3 Paraguai; Paraguai 3 x 2 Escócia; Iugoslávia 3 x 2 França; França 2 x 1 Escócia; Iugoslávia 3 x 3 Paraguai; Suécia 3 x 0 México; País de Gales 1 x 1 Hungria; México 1 x 1 País de Gales; Suécia 2 x 1 Hungria; Suécia 0 x 0 País de Gales; Hungria 4 x 0 México; País de Gales 2 x 1 Hungria; Brasil 3 x 0 Áustria; Inglaterra 2 x 2 União Soviética; União Soviética 2 x 0 Áustria; Brasil 0 x 0 Inglaterra; Áustria 2 x 2 Inglaterra; Brasil 2 x 0 União Soviética; União Soviética 1 x 0 Inglaterra; Alemanha 1 x 0 Iugoslávia; Suécia 2 x 0 União Soviética; França 4 x 0 Irlanda do Norte; Brasil 1 x 0 País de Gales; Suécia 3 x 1 Alemanha; Brasil 5 x 2 França; França 6 x 3 Alemanha e Brasil 5 x 2 Suécia (fotos).
CLASSIFICAÇÃO FINAL – 1 – BRASIL; 2 – Suécia; 3 – França; 4 – Alemanha; 5 – País de Gales; 6 – União Soviética; 7 – Irlanda do Norte; 8 – Iugoslávia; 9 – 10 – Tcheco-Eslováquia; 11 – Hungria; 12 – Inglaterra; 13 – Argentina; 14 – Escócia; 15 – Áustria e 16 – México. (fotos reproduzidas da revias O Cruzeiro).
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