Vasco

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sábado, 14 de junho de 2014

9 - NO MUNDO DA COPA - MEDICI

Em 2004, quando a Seleção Brasileira comemorava 40 anos da conquista do tri, no México, o ex-ministro Jarbas Passarinho concedeu-me esta entrevista, para o "Jornal de Brasília". O início da década-1970 ainda era marcada pela luta entre o governo militar do general Garrastzu Médici e a guerrilha urbana, os chamados subversivos, que chegavam a seqüestrar embaixadores. Falou-se muito que o presidente usava o futebol para promover o seu governo e que conquistar a Copa do Mundo era um imperativo para o Palácio do Planalto. O ministro da Educação, Cultura e Desportos da época, o coronel Jarbas Passarinho, voltou ao passado e relembrou do que jurava ter sido verdade e o que virou lenda.  Confira o bate-papo.
 JBr – A Seleção Brasileira estava em crise, durante os preparativos para a Copa -70, no México. Com ministro da Educação, Cultura e Desportos, é verdade que o senhor prometera cobrar explicações da Confederação Brasileira de Desportos (CBD)?

R -  Havia críticas à Seleção, por todo o País, e isso preocupava a todos nós. Falei com o presidente da CBD, o João Havelange, que o (Garrastazu) Médici (presidente da República) interessava-se muito pelo tema e que era preciso uma providência. O presidente gostava tanto de futebol, que acompanhava jogos com o radinho de pilha colado aos ouvidos. Enfim, o ambiente estava muito conturbado, com o João Saldanha municiando a imprensa, após ter sido trocado pelo Zagallo.   

 P -  Verdade, ou lenda, que o João Saldanha lhe procurou para fazer denúncias?

 R – Na verdade, eu o convidei a visitar-me, para conversarmos sobre as denúncias que ele fazia à imprensa. Ele veio a Brasília, ficamos só nos dois, no meu gabinete, e pedi-lhe as suas denúncias por escrito. Prometi-lhe investigá-las, depois da Copa do Mundo, qualquer que fosse o resultado da Seleção. Mas, por ora, que ele parasse com aquilo, porque prejudicava a equipe, que vinha levando vaias da torcida. Então, ele desfilou as suas denúncia e eu as anotei. 

 P – Quarenta anos depois, o senhor ainda se lembra dessas denúncias?

 R – Me lembro que mandei a minha secretária datilografá-las e lacrei o envelope. O que ainda tenho firme na memória é a queixa do Saldanha sobre a nova doutrina passada aos jogadores, após a sua troca pelo Zagallo. Ms o que e chamou mais a atenção foi a insistência dele em denunciar homossexualismo no basquetebol juvenil. Nada tinha a ver com a Seleção. A imprensa disse, depois, que o Zagallo tinha atendido ao presidente Médici, para convocar o atacante Dario (Atlético-MG), mas isso é lenda. Ele nunca esteve comigo (por quem passaria, primeiramente), e nem com o presidente.

 P – Falou-se que o ministro da Educação, Cultura e Desportos dissera que o clima pesado em torno da Seleção abalava a opinião pública do país e que era preciso transformá-la em modelo de ordem e disciplina. Também, que o senhor discutia isso com o presidente Médici, enquanto o João Havelange reunia-se com os ministros dos gabinetes civil (Leitão de Abreu) e militar (general João Figueiredo), além do chefe do Serviço Nacional de Informação (general Carlos Alberto Fontoura). Verdade?

 R -  A fala atribuída a mim é verdade, mas reunião do Havelange com ministros é lenda. O Havelange reuniu-se comigo, e ficou de tratar do assunto. Então, essa missão ficou muito bem desempenhada pelo brigadeiro Jerônimo Bastos. (presidente do Conselho Nacional de Desportos e chefe da delegação Brasileira na Copa-70). O que eu dissera sobre ordem e disciplina havia dito ao Saldanha, quando pedi-lhe para parar de atordoar a Seleção.        

 P – A imprensa divulgou, também, que Havelange, após ter vindo a Brasília, teria que submeter à aprovação do governo todos os seus futuros atos á frente da CBD...

 R -  Lenda. O Havelange tinha muito bom relacionamento com o (presidente) Medici.

P – Como ministro responsável pelos desportos, durante  Copa-70, o senhor acompanhava os jogos junto com o presidente?

R – Não. Só estive junto com ele nesses momentos quando fomos a um jogo do Flamengo, no Maracanã. Fiquei preocupado com a possibilidade de alguma manifestação desagradável a ele, porque o governo, naquele momento, enfrentava a guerrilha urbana. Quando o locutor do estádio anunciou a sua presença, as minhas pernas tremeram. Mas o que aconteceu foi muitos aplausos e nenhuma vaia.

P – Está escrito em vários livros e revistas que o presidente Médici tinha a obsessão de legitimar o seu mandato pelo apoio popular e que isso passava pela Seleção Brasileira trazendo o tri do México...

R – O presidente não tinha tal obsessão. Naturalmente, seus assessores, sim. Ele tinha grande popularidade, não precisava daquilo. Fui testemunha do clamor do povo em torno dele, em São Paulo, e no Pará, durante a sua maior festa religiosa, o Círio de Nazaré. 

P -  É verdade, como saiu, recentemente, em um livro, que o presidente Médici, para popularizar o seu governo, telefonou aos jogadores da Seleção, após a vaga na final da Copa (vencendo o Uruguai, por 3 x 1), incitando-os à vitória sobre a Itália, na final?

R -  Eu jamais soube disso e duvido. Acho uma maldade escreverem que o presidente precisava disso para popularizar seu governo. Ele teve contato com o brigadeiro Jerônimo Bastos, que lhe foi levado pelo Havelange, quando eu o convidei para presidir o CND. 

P -  No dia em que a Seleção passou à final da Copa do Mundo (17.06.1970), o governo do general Médici trocava 40 presos políticos pelo embaixador alemão Von Holleben. Falou-se que os jogadores da Seleção condenaram o ato, lá do México...

 R – É outra invenção maldosa. O que de oficial saiu do governo naquele dia foi a condenação à insubordinação do coronel Dickson Grael, por liderar pára-quedistas para tentar impedir a partida dos presos políticos para a Argélia. Felizmente, ele chegou 15 minutos atrasados.

P – Foi amplamente divulgado que o presidente Médici dera o palpite de 4 x 1 para o Brasil no placar da final da Copa. Foi mesmo?

R – Eu perguntei ao presidente porque ele havia apostado em um placar tão alto numa final de Copa do Mundo, e ele me respondeu: ‘O meu palpite seria 2 x 1, mas, partindo de alguém que conhecia bem, acompanhava o futebol (fora atacante juvenil do Bagé-RS), palpitar um placar apertado daria a entender que o presidente da república não tinha confiança na sua seleção. Então, aumentei pra 4 x 1.
P -  Havia muito, nos jornais, fotos do presidente com o radinho de pilha, acompanhando o futebol. Ele discutia, também, com os amigos mais chegados, sobre jogos?

R -   Me lembro que, nas segundas-feiras, eu e o ministro Leitão de Abreu costumávamos comentar com ele sobre as vitórias e derrotas do Grêmio e do Flamengo, os seus dois times prediletos. Coisas mesmo de torcedor – Jabás Passarinho, antes de ser militar, foi atacante juvenil do paraense Clube do Remo.


         




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