Dez campeões mundiais de 1958 - De Sordi, Djalma
Santos, Bellini, Zito, Dino Sani, Moacir, Mazolla, Pelé, Zagallo e Pepe – estiveram em Brasília,
em 2008, recebendo homenagens do governo do Distrito Federal. Eles jogaram em um tempo em que não exista bolas e chuteiras tão leves,
quando era difícil obter informações sobre os
adversários. Esta é a reprodução de uma uma entrevista que fiz com eles para o "Jornal de Brasília".
JBr - Como foi a expectativa de estrear na Copa de 58?
Zito ? O momento de entrar em campo é mais especial. No aquecimento, já
se sente o clima do jogo, que se torna mais temeroso à medida em que este é
mais importante, exige mais esforço. Entrei no time com tranqüilidade total,
com muita vontade e sorte, porque, junto comigo, entraram o Pelé e o Garrincha. Foi em um bom
momento, quando o time ficou encorpado e tudo tornou-se mais macio.
Dino Sani - Havia a preocupação, a tensão da espera, mas, depois que a
bola rola, tudo acaba, você já está no clima. Havia, também, a preocupação de
saber como jogava o adversário (Áustria), pois não conhecíamos ninguém, o que
só ocorria na hora do jogo. Eles tinham uma boa equipe, nos surpreenderam, com
um passeio danado, nos primeiros 20 minutos. Mas, depois, apertamos mais a
marcação, tomamos conta da partida, fizemos três gols e liquidamos tudo.
Mazolla - Estávamos em uma chave muito difícil, pois a Áustria, a Rússia
e a Inglaterra eram os melhores times do mundo. Eles (os austríacos) tinham
grandes jogadores, mas, momentos de sufocos, sempre há nos jogos.
Mazolla - Eu considero o jogo contra o País de Gales, porque eles
atuaram muito retrancados. Foi difícil sair um gol, penetrar na defesa deles.
Dino Sani - Contra os ingleses, foi tudo estudado dentro do campo, pois
ninguém conhecia ninguém. O empate foi um resultado muito bom, mas tivemos
chances de gol.
Zito - Eles estavam entre os
favoritos, bem preparados, com uma força diferenciada, sabíamos daquilo. Mas
nós não temíamos time nenhum. Só a França nos exigiu um pouco mais de respeito,
sem ser um temor.
Orlando - A gente dizia, vamos jogar, entrar pra vencer. Entramos em
campo pensando assim, todas as vezes.
Mas conta-se que havia muita curiosidade sobre o tal do cérebro
eletrônico soviético...
Zito - Lenda! O que me lembro bem dos russos foi que estávamos
concentrados em uma cidadezinha rural, vizinhos deles que, as vezes, ficavam vendo, à distância, a gente brincar
com a bola. Até gostaram e aprenderam a fazer rodinhas de bolo. Mas nunca houve
contatos diretos nessas ocasiões.
Os franceses dizem que, se não tivessem perdido o Jonquet, a história
seria outra...
Zito - Acho que o Brasil ganharia do mesmo jeito. Seria mais difícil,
pois, com 11, eles nos exigiam muito. Esfriaram, um pouco, com a perda do
Jonquet (fratura de fíbula, numa dividida com Vavá), mas, àquela altura da
Copa, o time brasileiro era difícil de segurar. Quanto ao lance da contusão,
foi casual, nada de proposital, sem querer mesmo. Não tínhamos nenhum jogador
desonesto.
O clima antes da final, contra a Suécia, foi apreensivo ou
descontraído?
Zito - Havia muita ansiedade, porque, se ganhássemos o jogo, seríamos
campeões do mundo, algo que o Brasil
jamais conseguira. Queríamos que o tempo passasse o mais depressa
possível, pois sabíamos da nossa força. Não havíamos visto o time sueco jogar,
mas tínhamos informações.
De Sordi - Eu andava bastante triste, pois vinha sendo o titular (da
lateral-direita) e não jogaria a partida final, a da consagração, porque não
estava bem, fisicamente, com uma distensão muscular. Fiz tratamento, mas não
resolveu, não adiantava entrar em
campo. Eu vinha treinando, levemente, sem poder fazer força,
para não sentir dor. Mas dei a volta olímpica, devagar, fui junto, com o
pessoal. Acontece com quem joga futebol.
Dino Sani - É a pior coisa que existe, você não jogar, ou não estar
pronto para, de repente, entrar na equipe.
Ter sofrido o primeiro gol da final, arrepiou vocês?
Zito - Nem um pouquinho. Nós tínhamos muita confiança, como mostra
aquele filme em que o Didi pega a bola no fundo do gol e sai caminhando,
devagarinho, como se dissesse, ?calma, que não tem nada perdido?. Dali pra
frente...
Zagallo - Pouca gente sabe, é pouco publicado. Quando estava 1 x 0 para
a Suécia, o ponta-esquerda sueco, o Skoglund, fez um cruzamento para o gol, e
eu tirei a bola (que ia entrando), de cabeça. Dali pra frente, o Brasil empatou
e ganhou o jogo, com facilidade.
No filme daquela final, você aparece correndo para falar com o
Didi, que caminhava com a bola nas mãos, após o primeiro gol sueco. O que você falou com ele?
Zagallo - O Didi, que era mais
experiente e mais velho do que eu, estava tão tranqüilo, caminhava tão
lentamente, que corri para cobrar-lhe, dizendo: Ô Didi, foi eles quem fizeram o
gol. Nós estamos perdendo o jogo. Ele
respondeu: ?Calma, rapaz! Vamos com calma, que ganharemos este jogo!? Demos a
saída e você sabem o que aconteceu (a virada do placar).
Dino Sani - Mais dentro de campo. Cada um tem um tipo de liderança. O
Zito, por exemplo, jogava gritando, falando com o pessoal. Quando se faz a sua
jogada, se atua para a equipe, também se exerce o papel de líder.
E você, Mazolla, ficou
aborrecido quando foi barrado, para a entrada do Vavá?
Absolutamente, não. Foi uma escolha muito certa do técnico Vicente
Feola, pois o Vavá era muito mais adaptado àquele tipo de jogo (que a Copa exigia).
E o Garrincha, era maluco, mesmo?
Zito - Maluco, nada. E nem precisava falar com ele, que tinha uma forma
de jogar só dele. Ninguém fazia como ele. Era só tocar a bola pra ele e
deixá-lo fluir.
Dino Sani - Ele era um moleque. Vinha por trás da gente e dava um toque
naquele nervinho do cotovelo, provocando um choque chato. Batia, saía correndo
e nos deixava loucos. E eu nunca fui de brincar. Já estava com 26 anos, era
mais sério do que hoje.
Zagallo - Havia espaço (para se jogar), sem dúvida. Mas, sempre digo
que, naquele tempo, a técnica sobrepujava a força. Hoje, a preparação física
sobrepuja a técnica. Havia grandes jogadores, grandes clássicos, tempo para se
raciocinar. Agora, é uma correria, pensa-se, primeiro, em não deixar o
adversário jogar.
Mazolla - Hoje, o atleta tem uma tarefa a cumprir. Em 58, ocupávamos a
nossa posição, limitados, mas tínhamos autorização para criar. Isso é uma das
razões pelas quais quase não há mais poesia no futebol. Quem cria, agora, é
criticado. Mas acho que eu conseguiria ser centroavante, hoje. É uma questão só de treinamento.
Mazolla - No primeiro, o Zagallo cruzou, da esquerda, eu matei a bola no
peito e bati, de fora da área, com um chute violento. No segundo, fui lançado,
pelo Didi, e chutei no canto, também de fora da área.
Zito - O Pelé foi o maior jogador de todos os mundos. Dava uma
tranquilidade imensa a quem ficava atrás. Tive essa sorte em um grande elenco,
com todos muitos bons, mas o Pelé superava nós todos. No Santos, ele chegou
garoto, quando eu já era muito exigente, xingava demais. Acho que coloquei uma
linha de conduta para ele, dentro de campo, e creio que aprendeu muito com
isso. O Pelé me respeitava bastante, mas eu não o ofendia. Só lhe exigia, como
um chefão.
De Sordi - Foi uma sensação muito boa ver (brilhar) aquele garoto
simples que estava começando. Ali, ele (Pelé) se empolgou. Ganhando a Copa,
ajudou na valorização do jogador brasileiro, o que não existia.
De Sordi - Foi a maior emoção que tivemos, todo mundo chorando. Afinal,
o Brasil ganhara a Copa do Mundo, fora do País, na Europa. Aquilo nos
valorizava muito. Na volta pra casa, dentro do avião tomamos uns uísques,
servidos pela direção (da CBD). Foi uma brincadeira só. Muita alegria.
Zito - O nosso foco era a Copa, algo tão gigantesco, que nos fez
esquecer do resto. Tem-se que estar bem preparado para aquilo, e nós estávamos
Orlando - Hoje, eles ganham muito e não jogam nada. No meu tempo, não
ganhamos nada e jogamos muito.
Moacir - Um jogador mais de cabeça, de raciocínio, de ajudar os
companheiros, que se sentia responsável por todos os problemas do time dentro
de campo.
Zagallo - Tive a felicidade de fazer o vai-e-vem, pela
ponta?esquerda, uma mudança tática muito
grande da seleção brasileira, pois, até então, usávamos o 4-2-4, que deixava o
time muito aberto. O Feola tinha o Pepe,
que era mais ofensivo, mas preferiu variar para o 4-3-3, e fizemos uma Copa
brilhante.
Zagallo - Eu era driblador nato, no Flamengo, e, sempre que driblava, o
Fleitas Soliche (treinador) apitava falta contra mim. Temendo perder a posição,
passei a soltar mais a bola. Já que eu tinha uma condição física muito boa,
passei a fazer a dupla função (de atacar e defender). Num dia de clássico
contra o Botafogo, o Paulo Amaral (preparador físico da seleção de 58), me
avisou que eu seria observado pela comissão técnica da seleção. Estive bem e fui
convocado. O restante da história.
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