Vasco

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sábado, 14 de novembro de 2020

O VENENO DO ESCORPIÃO - CACHAÇA, A QUE PINGA NO PESCOÇO POR DENTRO

 Conta o livro A Báblia, livro que vem sendo escrito pelo autor destas mal traçadas linhas, que o inventeiro destas plagas, cansado de tanta labuta, arresorveu tirar uma sonequinha dentro de um canavial. Madorna tão boa e sombreada que, ao despertar, outorgou à planta o direito e açucarar a vida de todos os vagabundos do pedaço. De parte, assuntando tudo, um roqueiro que tocava o Rock Diabral, de autoria deste mesmo izcrivinhador, achou que tirar uma palhinha por ali deveria ser um tremendo barato. Lêdo engano, pois as folhas do canavial o arranharam. Pê da vida, ele inventou a cachaça, que ganhou dezenas de onomatóposes, o apelido oficial do apelido, cujo mais badalado é pinga.   

Tem freguês que prova e quer mais

 Pois bom, mermão! Esta tar de pinga (caso o cavalheiro ainda não tenha sido apresentado à dita cujadeve ser uma mulher muito bonita e gostosa. Frenética! Tanto que já arreliou tantos furdunços, que nem é bom contar. Mas vou fuxicar.

 Pra início de conversa, ressalte-se que a cachaça nasceu colega do Viagra, por acaso. Com tanta cana plantada pelos colonizadores portuguinhas na paulista São Vicente do século16, eles terminaram chegando até a danada. E, de bicada em bicada, deram-lhe valor monetário no comércio de escravos. Três séculos depois, a marvada já estava virando símbolo da resistência à colonização portuguesas, metendo o bedelho em festas populares, em letras de canções e até dando palpite na literatura brazuca.

 Quem foi o primeirão a destilar o que saía da sacana, isto é, da cana-de-açúcar, não se sabe. Só se sabe que o carinha deixou de faturar muita grana, deixando de registrar a invenção que,  atualmente, passa dois bilhões de litros anuais prouzidos. Vai ter pingunço assim lá em casa! – onde, por sinal, quando chove, só é lá fora; dentro, pinga. Aliás, quando chove lá fora e, dentro, tenho visitas, pego um limão de casca mole; duas colheres de chá, cheias com açúcar; duas doses de pinga e gelo picado, e pico fogo na rapaziada. Meu irmão! É a tal da caipirinha que, no meu barraco, faz mais sucesso do que show de Waldick Soriano pelo Nordeste.

Dizem que todo consolo é pouco

 Como ninguém sabe do nome do inventor da destilação da cachaça, o que já pintou de picareta reivindicando a glória, not mole, não! O maior desses picaretas foi o alquimista catalão Arnaldo de Vilanova, que teria manipulado líquidos de frutas, lá pelo século 14. Os árabes, também, já andaram querendo beliscar a conta, como pais da matéria - por sinal, reprovada pelo Papa, que a a tinha por coisa do diabo. Por isso, a perseguiu muito. E até tinha receita para pinguço parar de beber: raiz, de quatro dedos, de jurubeba; semente de vagem mais alta da árvore; sete folhas de mangueira, cortadas pelo meio e pisadas em uma pedra; raspa de uma raiz; uma xícara de vinho tinto; meio-litro de água serenada e cheiro de limão; tudo isso dentro de um copo de pinga; lave bem um litro de vidro pra receber  tudo isso e deixe-o virado de boca pra baixo, assim ficando por quatro dias. Uma outra receita, mas esta apócrifa, recomenda para se livrar da cachaça misturar nela três gotas de sangue de urubu, minhoca, cavalo marinho e bicho de cana torrado.         

 Dizem os entendidos que é bom ter certos cuidados quando molhar o pescoço por dentro, evidentemente, com uma quentinha - dizem as más línguas que água enferruja. Por exemplo, não se deve beber pinga e comer manga meio-verde. Sem problemas: da minha parte, prometo nunca mais comer manga verde. Nem beber pinga com farinha - é o mesmo que ir a uma festa e dançar com a mulher a gente. Por isso, pra não acontecer, rezo: “Santa cana que está na roça/Santificado seja o vosso produto/ Venha a nós o vosso líquido/ Pra satisfazer a vossa vontade/Assim no boteco como em qualquer lugar/O garrafão nosso de cada dia/Nos dai hoje/Perdoai as vezes em que bebemos de menos/Não nos deixai cair atordoados/Livrai-nos da rádio-patrulha, amém!     

Pode até ser que cure, mas não se conhece
 ninguém que foi pro lado de lá e voltou

 De acordo com baianos cachaceiros (curriola no meio da qual me incluo), em tempos passados, Santo Onofre era o padroeiro das mulatas dengosas e apimentadas que queriam se casar com  um português (e lhe tomar a grana e lhe meter chifres) que vinha colonizar o Nordeste. Onofrão armava tudo, mas não deixava de cobrar, pra ele, a primeira dose da furdunceira, após o padre casar o futuro chifrudo. Aliás, conta-se, também, que Santo Onofre bandeou grande quantidade de mulatas baianas para lares de portugueses ricos e solteirões, quando ele andou quase perdendo o emprego para Santa Joana D´Arc, aquela que pegou fogo – sem ser por uma esquentadeira, mas incendiada, na fogueira, pela Santa Madre Igreja Católica.

Em tempos pós-modernos, a partir da brasileira década-1930, o escritor  Mário de Andrade passava adiante que pinga com jasmim do campo era tão, tão que permitia até menino encapetado sair na chuva e não pega resfriado. De sua parte Jorge Amado teve no personagem Curió um useiro e vezeiro da receita de pinga com sal, para reverter apagões de sua voz quando estava no exercício da profissão de camelô. Só que ele, de vez em sempre, esquecia do sal. 

                              Porque Pelé marcou mais de mil gols?
                             Só jogou contra goleiro bêbado, dizem.

 Até o "Rei do Futebol", um tal de Pelé, anunciou a danada, em seus inícios de carreira. Hoje, não quer papo com a espevitada. Mas já mordeu uma graninha em cima dela. Enfim, com ou sem Pelé no lance, pela consulta feita pelo Kike ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual-INPI, há mais de 20 mil títulos de pinga no mercado brasileiro. Entre as tais, os mais populares são: Amansa  Corno; De Paulá; Peituda; Velhaca; Cura Veado, Água Santa, Manda Brasa e Zero Quilômetro, todas com desenhos de mulheres e homens em completa sacanagem –  do jeito eu o diabo gosta!  

 

        

  

      

 

 

 

 

 

 

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